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Mostrando postagens de fevereiro, 2012

ZAPAVORA

                                 Era uma casa localizada na Rio Grande do Norte com Contorno, perto da trincheira, ali onde os carros mergulham para passar sob a avenida: um dos últimos prédios belle époque remanescentes na cidade, uma incongruência quando comparado ao muro de concreto que abre a rua em “u” e marca o predomínio da máquina sobre a poesia. Subia-se pelo lado esquerdo até avistar os letreiros em neon sob fundo vermelho cintilante: “Zapavora”.             O nome veio dos versos da canção “Nosso amor assim nos apavora”, de... quem mesmo? Se me lembrar, prometo contar antes do final.   Hippies, broncos, darks, mods, punks e distraídos em geral, todos se encontravam por ali. O cigarro ainda não era proibido em recintos fechados e o que era proibido circulava com igual liberdade, por isso o ar era embaçado e quente, dava para contar com faca ou tomar como sopa de cogumelos.             À direita, balcão-recepção-toques; à esquerda, mesas e tamboretes altos de

A POESIA HERÓICA DOS 20 ANOS

Campos da UFV, Universidade Federal de Viçosa                         Schiller dizia que o poeta é “o vingador da natureza”, no sentido de que resgata no homem sua natureza e unidade originais. Isto no final do século XVIII, quando a máquina a vapor era uma promessa tecnológica semelhante ao foguete espacial brasileiro.       E o poema é o recriador desta unidade, perfeição ou ideal – o que é idéia minha e não de Schiller. Todo poema que se preze deve ser recriador e definitivo.          O Bandeira, que, aliás, se considerava um “poeta menor”, escreveu que era muito mais um apreciador de poemas do que de poetas, porque “há poemas perfeitos, mas não há poetas perfeitos”.            Então, viva meus amigos desconhecidos! Gente que anda hoje de perfil baixo sob as nuvens da realidade, mas que deixaram em minhas mãos em algum momento amostras de sua inspiração, que me proponho a trazer à luz, como já fiz em outros  posts  deste blog.            O ano é 1980, o lugar

O CENTAURO

       A furreca, com quatro alto-falantes abertos, anunciava imperiosamente a “chegada do Gran Circo de México nesta cidade – Feras, trapezistas, palhaços e mil, mil e uma atrações! O mágico Mefisto, os irmãos González, os maiores trapezistas do mundo! E a grande atração internacional: o Centauro!”        O Centauro? O que raios isso queria dizer? Um desconhecido animal? Uma nova forma de ilusionismo? Um barco alado?        “O centauro”, prosseguia o locutor, “a figura mais marcante, jamais vista nos picadeiros de todo o mundo. Ele transformará seus conceitos, elevará sua mente, despertará seu desejo.”        Palavras portentosas demais para passarem despercebidas, sobretudo num lugar onde praticamente nada acontecia de novo desde a chegada do rádio de pilha, o qual havia despertado comentários assustados, tipo “mas quem é mesmo que está falando aí dentro?” ou desde o sobrevôo do primeiro avião nos céus da cidade, o que, dizem, levou gente a fugir para as montanhas ou at

A POESIA DE RAIMUNDO NONATO E JOVINO MACHADO

                    Mais dois volumes de poesia de minha biblioteca de poesia, dois poetas de estilos completamente distintos, mas igualmente reveladores da poesia que nasce das ruas das grandes cidades.          O primeiro é Raimundo Nonato e seu livro Sabor Plástico , pequena brochura de 10,5 X 16 cm, publicada em Belo Horizonte em 1983.                    Livrinho que é a própria imagem da simplicidade, esse volume prova que tamanho não é documento. A qualidade intrínseca da poesia que ele encerra é enorme.           O poema de abertura, no qual o poeta faz sua profissão de fé, traz lampejos de Oswald de Andrade e seu Pau Brasil , além de flertar confessadamente com outras tendências: sou um poeta beat (close) made in brazil (pose) província de minas vitaminas proteínas e sais minerais pela cor do tênis vê que ainda estou caçando a esmeralda no fundo no fundo sou um brazilianist deslumbrado com a alquimia dos sanduíches rajneesh