Além
de pouco stress, muita segurança, boa qualidade de vida e ser uma cidade
pequena ligada ao mundo - não apenas conectada -, Timóteo surpreende por um
aspecto que passa praticamente despercebido à maioria: o grande número de animais
na zona urbana, entre os quais os passarinhos.
Domésticos,
desgarrados ou silvestres, os animais nos dão um belo exemplo de coexistência.
Cães com coleira, acompanhados dos respectivos donos, desfilam por toda parte como
filhos bastardos. E há também os solos, cães vadios independentes, que percorrem
as ruas com desenvoltura e dão lições de civilidade a certos humanos, como a de
atravessar – sempre - na faixa de pedestres.
Micos
podem ser avistados em vários lugares, vez por outra um guaxinim morre sob as
rodas dos carros, garças (pelo menos um casal delas) procuram alimento nas
águas turvas dos córregos que cortam a cidade, jacus frequentam quintais em
alguns bairros, pardais feito praga, rolinhas, bem-te-vis e canários, em nuvens
como gafanhotos. Por que, ao invés de buscar abrigo na mata cerrada, os animais
preferem a companhia dos humanos? Deve ser porque, com muitos competidores e
predadores, os bosques se tornaram territórios inóspitos, enquanto que a cidade
oferece muita abundância e quase nenhum risco.
Tem
o parque estadual do Rio Doce, localizado a poucos quilômetros de distância, tem
a reserva ecológica do Oikós dentro da cidade, têm as matas da companhia
siderúrgica ao redor, além de vários corredores verdes, e o resultado é essa
confluência feliz de animais no espaço comumente destinado a prédios e carros.
Durante
o dia, os canarinhos se dispersam à cata de comida. Frequentam a floresta de
fios, a copa das árvores, as praças - sempre aos pares, múltiplos de dois,
macho e fêmea, um mais amarelinho, outra mais verdinha. Quando a tarde cai, reúnem-se
em pontos estratégicos para trocar impressões sobre o dia de labuta e empoleirar.
É quando se pode vê-los pelo chão, numerosos como folhas vivas, catando as
migalhas que serão a última refeição do dia. A algazarra que fazem revela que o
dia foi produtivo e que eles estão muito contentes. Basta nos aproximarmos para
que alcem voo em direção à copa das árvores, abrindo as penas da cauda em forma
de leque e agitando as asinhas como duas hélices.
De
menino, raramente tinha a chance de vê-los assim de perto, embora muito o desejasse.
Sonhava com bandos de canários revoando sobre a fazenda, via em minha
imaginação alguns deles caindo direto no alçapão de talisca de coqueiro e talo
de embaúba que eu tinha zelosamente fabricado. Cheguei a pegar muitas garrinchas,
aqueles passarinhos bobos que entram literalmente pelo cano e você pode
pegá-los com a mão, maritacas atrevidas, doidas por uma merenda de graça,
papa-capins desastrados que caíam às dúzias no alçapão e o danificavam, coleiros
de plumagem cinza azulada e canto igualmente mavioso, mas os canários frustravam
meus planos. Eles não davam sopa perto de casa e, a mata, com seus caititus e
onças – conforme os relatos amedrontadores dos adultos –, não era lugar de
crianças.
A
postura do predador, tão mal praticada na infância e desaparecida na idade
adulta, faz agora toda a diferença. Os pássaros de hoje são protegidos por legislação
que lhes garante o direito de ir e vir. São como trabalhadores sindicalizados.
Seguem o exemplo dos cães vadios, disciplinados e sérios, que dominam o chão da
cidade, alimentando-se no lixo e dormindo nas marquises, onde podemos encontra-los
de manhã, roncando feito operários preguiçosos. Aqui não tem gavião, coruja ou
menino de alçapão e bodoque. Os pássaros estão em toda parte e não apenas no ar.
Bem-vindos
sejam os pequeninos!
©
Abrão Brito Lacerda
06.09.20
Comentários
Postar um comentário
Gostaria de deixar um comentário?