A família das Brassica
oleracea está em pé de guerra.
Um conflito
de enormes proporções, nunca antes registrado no mundo vegetal, capaz de fazer
estremecer o chão das hortas e colocar no limbo a dieta dos humanos e das
lagartas, por algum milagre da ciência reduzidos ao mesmo nível de QI.
A NASA e o
Vaticano já estudaram o fenômeno, e até nosso honroso ministro da justiça e dos
decretos pré-ditatoriais teve que sair à baila e dar palpite em um assunto que
não lhe pertence, uma vez que nos corredores do judiciário só se come nabo e
faisão.
Agora é a
vez do ministério das relações exteriores, que não sabe a diferença entre
Washington e Tel Aviv e pretende impor às nações formigas o modelo de
inteligência desenvolvido nos corredores do Itamaraty, dominado por abacaxis e
bananas e todas as castas, algumas, inclusive, em adiantado estado de
decomposição.
Não faltam
razões para o inconformismo que levou ao levante popular vegetal: os preços tão
nas alturas, e não sobra quase nada para os Brócolis e suas famílias. O
produtor fica com trinta por cento, o transportador com outros trinta, o
governo mais trinta – e o que sobra pras oleráceas?
Estão
pensando seriamente em invadir o Planalto e o Serrado, transformá-los em colônias
de alienígenas que comem humanos e veneram os Brócolis. E um conjunto de leis
será criado para submeter os bípedes pretensiosos, mais uma força de
inteligência brocolina para colocá-los na linha.
O Brasil foi
escolhido para pioneirar (desculpem o neologismo) o experimento por sua nova
agenda política, considerada a maior demonstração de que o desenvolvimento dos
humanos chegou a seu limite e que os
Brócolis têm tudo para tomar o poder.
Fica
evidente a superioridade dos Brócolis sobre os demais vegetais: quando apodrecem,
eles passam por uma reação química que os transforma em uma verdadeira bomba de
fedor. Isso é parte da inteligência dos Brócolis. Outro exemplo é sua
consistência tenra e firme, incomparável no Yakisoba e nos gratinados. A
sabedoria popular diz que quem não gosta de Brócolis, bom sujeito não é.
No Egito
antigo não havia nenhuma referência ao Broccolo, nem na Grécia ou em Roma. Os
Broccoli surgiram com as trupes medievais e se infiltraram nas cidades como
clandestinos, conspirando contra os poderes da burguesia. Há notícias de
Brócolis que se tornaram banqueiros e arcebispos, às vezes ambos ao mesmo
tempo.
Vem dessa
época seu ódio aos governantes tolos e perdulários. E seu inconformismo diante
da gente patética, desfilando com pena de pavão enfiada no rabo diante do
pavilhão pátrio, na maior cara de pau. A idiotice foi entronizada, os bundões
agora têm a palavra de ouro. Não é à toa que o Zé Presidente baixou um decreto
para que a polícia e a milícia cacem esses anarquistas vegetais, ricos em
cálcio, ouro e ferro.
Qualquer um
se revoltaria, ainda mais os Brócolis, sensíveis como são às causas sociais.
Desde sua
chegada ao Brasil, introduzido pela corte fugitiva dos Joões, os Brócolis não
pararam de subir na escala social. Totalmente em desacordo com sua tendência
popular e despojada. Deram-lhes casacas, voz para defender a monarquia e a
escravidão, os Brócolis adequaram-se mal aos costumes falsamente refinados da
corte que salvou a colônia da sanha paternalista da metrópole.
Os generais
da república odiavam os Brócolis. Getúlio era por outro lado um fã
incondicional. O ódio concretizou-se com o golpe militar e a guerrilha de
Marajó, quando Brócolis foram servidos vivos aos búfalos e aos cadetes. Foi
quase o fim da espécie no Brasil, poderiam ter sobrevivido nos compêndios
empoeirados das bibliotecas, mas não ao sol da praça pública, cada vez mais
ocupada por devoradores de Brócolis mesquinhos, vestidos de verde e amarelo.
Absorvendo a
energia solar através de sua pele de cetim, transformando luz em fibras
nutricionais, meditando pacientemente nos canteiros para sintetizar fósforo,
manganês, magnésio, carboidratos e proteínas, os Brócolis venceram pela
paciência e sabedoria. Decidiram que tinha chegado sua vez, espalharam-se pelas
redes sob pseudônimos, multiplicaram-se como salário de juiz, atraíram
seguidores e simpatizantes, lançaram manifesto, ergueram bandeiras – e puseram
o pedúnculo para comer.
Qualquer
forma de discurso tornou-se inútil, a ignorância venceu. A intelligentsia e a
Cecil B. Demência passaram a copular em indecente conjunção carnal, em horários
permitidos para menores de 12 anos, sob aprovação do congresso e do braço
executivo da boçalidade plutocrática. Os últimos mananciais não poluídos do
pensamento vegetativo e intuitivo devem ancorar-se agora no porto seguro dos
Brócolis. Eis a nossa salvação.
Os burros
não nos escoicearão e os aviões com destino a Brasília cairão diretamente nas
prisões, atraídos pelo magnetismo potente das antenas clandestinas da rede
espiã brocolina. As nuvens informáticas e as prensas entrarão em colapso e
passarão a difundir o hino nacional em hebraico pré-diluviano. Os crocodilos
sairão dos pântanos do Lago Sul e desencadearão uma verdadeira carnificina no
planalto central. Nas serras e no litoral a revolta estará a caminho.
O cogumelo
atômico será um pum de intestino flatulento diante da mega explosão dos
Brócolis conspiradores. O dia se aproxima, faça sua escolha. No último momento,
só escaparão os anárquicos corações poéticos.
©
Abrão Brito Lacerda
12 07 19
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